Faleceu o prof. Quadros Fernandes, pioneiro da informática nas escolas
Com 84 anos, faleceu no dia 27 de maio Manuel António de Quadros Fernandes, que foi professor na Escola Secundária Jácome Ratton em Tomar.
Apesar de já terem passado alguns dias não queremos deixar de registar este falecimento e lembrar quem foi o prof. Quadros Fernandes (N: 12/12/1931 F: 27/05/2016)
Visionário, conhecido pelo seu humor e sagacidade, contador de histórias, workaolic, generoso, honesto e a lista de adjetivos que o tornam grande não acaba.
Estudou medicina em Goa de onde saiu aos 19 anos. Em Lisboa formou-se em matemática e trabalhou na general Motors. Em 1963 foi professor de matemática em Sá da Bandeira (Lubango), onde casou e nasceram duas das três filhas (Rosa Brigida e Shilá). Foi em 1968, em Luanda que iniciou a sua carreira informática como analista de sistemas no Banco Comercial de Angola. Entretanto, nasce a terceira filha (Maria Carma). Regressa a Portugal em 1975 e fixa residência em Tomar onde morava o seu compadre prof Queirós da Silva. Lecionou na Escola Jácome Ratton, matemática, e informática. Em 1979 inicia o Club de Calculadoras (berço de alguns informáticos que saíram de Tomar) e inicia o programa de informatização das escolas "AE" implementado em mais de 600 escolas portuguesas. Deixa um último programa que a família vai partilhar.
São muitos os alunos que o referem como marcante, não só na vida pessoal como profissional.
A toda a família apresentamos sentidas condolências.
O prof. António Duarte Henriques Lopes, seu colega de profissão na mesma escola, publicou no facebook um texto de homenagem (In Memoriam, professor Quadros Fernandes), que transcrevemos:
“Faleceu o professor Quadros Fernandes, figura eminente do professorado tomarense e marca insigne da escola onde por muitos anos leccionou, a Escola Secundária Jácome Ratton. Por sentir que lhe é devida uma homenagem, ouso repor aqui um texto que sobre ele publiquei num dos órgãos da imprensa local, quando ainda, ambos, estávamos no activo.
Ei-lo:
«Incansável peregrino das suas muito pessoais miniaturas do mundo, o dr. Quadros Fernandes recose cada um dos seus intermitentes poisos com a inextricável rede das suas imprevisíveis, curtas, intempestivas deambulações. Contudo, quem acaba com a cabeça à roda somos nós.
Nós é que o seguimos no sobressalto das suas variações sobre o mapa inconcluso de uma demanda, de que a causa é segredo seu, mas de que o efeito é proveito nosso. Nós é que nos extenuamos na perscruta de um cais onde venha terminar-se a circum-navegação do paradoxo em que anda sempre embarcado. E nós é que ficamos imobilizados no pasmo por um discurso que, nos próprios soluços do seu entardecimento, encontra a força para reamanhecer.
Onde quer que entre, o dr. Quadros Fernandes parece trazer sempre demais o seu próprio corpo, como se este fosse um mero atrelado da sua necessidade de aparecer ou, então, um cabide para pendurar os seus cigarros.
Mas este corpo quase supérfluo, esticando-se no esforço de trepar e atropelar a sua própria compostura, transmuta-se, quando as condições o requerem, numa prodigiosa turbina de irradiação emotiva, de eloquência gestual e de turbulência expressiva.
Nesses momentos, a cuja eclosão basta só a nossa concessão de uma escuta, a paisagem em torno do dr. Quadro Fernandes torna-se vertigem - queda sucessiva para dentro de si mesma, que só a cadência da sua voz, assoberbada pelo seu atraso em relação ao seu próprio empenhamento, parece capaz de aguentar.
Quanto a mim, nem por nada me deixo enxotar desse espectáculo: o que aí se aprende, eu ainda não sei - sei só que se aprende.
Vinda não sei de onde, a enxurrada de ideias que ele desfere, que ele empola, que ele lapida, cai sobre o nosso aturdimento como, sob os espasmos de luz de uma discoteca, parecem cair os corpos no frenesi da sua dança. E como numa dança, a sua palavra salta, rodopia, esconde-se, cansa-se, explode.
Escutando-o, escutamos primeiro essa espécie de desfaçatez que sempre, com ele, serve para inculcar, na disposição das rotinas, a sensata suspeita sobre a inocuidade ou o conceito apoucado.
Depois, mais atentos, começamos a perceber uma estratégia de argumentação que, movida por uma deliberada preferência pelo aforisma, procura esculpir um corpo de princípios, cuja estranheza eu ainda não consegui bem identificar.
Parece-me essa estranheza, umas vezes, advir da paralaxe em que se coloca um apetite pensante avesso às facilidades do óbvio e, outras vezes, parece-me o efeito de uma postura ficticiamente predadora que, fascinada pela sua própria exuberância, encontra no território da entorse lúdica a sua única saída.
O humor que, no dr. Quadros Fernandes, é uma marca sempre em transe de revelação, cresce primeiro nessa espécie de desmesura com que ele, pisando sobre a infimidade avulsa das circunstâncias, logo ressalta para torneios de quase quixotesca especulação. Como se qualquer motivo mínimo contivesse sempre a concitação máxima da urgência de um serviço - o serviço de sentinela ao poder da fala, sempre à espreita da sua oportunidade.
Mas o humor, no dr. Quadros Fernandes, encontra a sua mais apurada variante no modo como, a partir de uma aguda percepção das conexões que constituem como grupo uma massa de interlocutores, consegue, recorrendo à desfiguração caricatural, recolocá-las num plano onde a sua liberdade de jogo e os jogos da sua liberdade ganham a sua maior ênfase. O desfrute é o seu tributo magnânimo à amizade.
Só que, em todos os casos, ele não pode dissimular a sua instante obsessão: a seriedade de uma perscruta sobre o essencial do que, mantendo-se ainda como humano, vai perdendo a sua altura na rotina congelada da experiência.
Por isso, a sua perspectiva é a do voo da águia: a visão da minúcia do alto da compreensão sempre mais larga da paisagem. E é essa visão aberta ao imprevisto, captado no pico do seu voo, que permite à sua seriedade a transbordância do humor. Felizmente, ele prefere voar em formação.»
(Um último recado, dr. Quadros Fernandes!)
Sempre lhe ouvi declarar: «Entre mim e Deus há uma relação de mútuo respeito e recíproca admiração!» Se agora vier a descobrir que lhe pedem explicações sobre tão elevada pretensão - conte com o meu testemunho abonatório.”
Apesar de já terem passado alguns dias não queremos deixar de registar este falecimento e lembrar quem foi o prof. Quadros Fernandes (N: 12/12/1931 F: 27/05/2016)
Visionário, conhecido pelo seu humor e sagacidade, contador de histórias, workaolic, generoso, honesto e a lista de adjetivos que o tornam grande não acaba.
Estudou medicina em Goa de onde saiu aos 19 anos. Em Lisboa formou-se em matemática e trabalhou na general Motors. Em 1963 foi professor de matemática em Sá da Bandeira (Lubango), onde casou e nasceram duas das três filhas (Rosa Brigida e Shilá). Foi em 1968, em Luanda que iniciou a sua carreira informática como analista de sistemas no Banco Comercial de Angola. Entretanto, nasce a terceira filha (Maria Carma). Regressa a Portugal em 1975 e fixa residência em Tomar onde morava o seu compadre prof Queirós da Silva. Lecionou na Escola Jácome Ratton, matemática, e informática. Em 1979 inicia o Club de Calculadoras (berço de alguns informáticos que saíram de Tomar) e inicia o programa de informatização das escolas "AE" implementado em mais de 600 escolas portuguesas. Deixa um último programa que a família vai partilhar.
São muitos os alunos que o referem como marcante, não só na vida pessoal como profissional.
A toda a família apresentamos sentidas condolências.
O prof. António Duarte Henriques Lopes, seu colega de profissão na mesma escola, publicou no facebook um texto de homenagem (In Memoriam, professor Quadros Fernandes), que transcrevemos:
“Faleceu o professor Quadros Fernandes, figura eminente do professorado tomarense e marca insigne da escola onde por muitos anos leccionou, a Escola Secundária Jácome Ratton. Por sentir que lhe é devida uma homenagem, ouso repor aqui um texto que sobre ele publiquei num dos órgãos da imprensa local, quando ainda, ambos, estávamos no activo.
Ei-lo:
«Incansável peregrino das suas muito pessoais miniaturas do mundo, o dr. Quadros Fernandes recose cada um dos seus intermitentes poisos com a inextricável rede das suas imprevisíveis, curtas, intempestivas deambulações. Contudo, quem acaba com a cabeça à roda somos nós.
Nós é que o seguimos no sobressalto das suas variações sobre o mapa inconcluso de uma demanda, de que a causa é segredo seu, mas de que o efeito é proveito nosso. Nós é que nos extenuamos na perscruta de um cais onde venha terminar-se a circum-navegação do paradoxo em que anda sempre embarcado. E nós é que ficamos imobilizados no pasmo por um discurso que, nos próprios soluços do seu entardecimento, encontra a força para reamanhecer.
Onde quer que entre, o dr. Quadros Fernandes parece trazer sempre demais o seu próprio corpo, como se este fosse um mero atrelado da sua necessidade de aparecer ou, então, um cabide para pendurar os seus cigarros.
Mas este corpo quase supérfluo, esticando-se no esforço de trepar e atropelar a sua própria compostura, transmuta-se, quando as condições o requerem, numa prodigiosa turbina de irradiação emotiva, de eloquência gestual e de turbulência expressiva.
Nesses momentos, a cuja eclosão basta só a nossa concessão de uma escuta, a paisagem em torno do dr. Quadro Fernandes torna-se vertigem - queda sucessiva para dentro de si mesma, que só a cadência da sua voz, assoberbada pelo seu atraso em relação ao seu próprio empenhamento, parece capaz de aguentar.
Quanto a mim, nem por nada me deixo enxotar desse espectáculo: o que aí se aprende, eu ainda não sei - sei só que se aprende.
Vinda não sei de onde, a enxurrada de ideias que ele desfere, que ele empola, que ele lapida, cai sobre o nosso aturdimento como, sob os espasmos de luz de uma discoteca, parecem cair os corpos no frenesi da sua dança. E como numa dança, a sua palavra salta, rodopia, esconde-se, cansa-se, explode.
Escutando-o, escutamos primeiro essa espécie de desfaçatez que sempre, com ele, serve para inculcar, na disposição das rotinas, a sensata suspeita sobre a inocuidade ou o conceito apoucado.
Depois, mais atentos, começamos a perceber uma estratégia de argumentação que, movida por uma deliberada preferência pelo aforisma, procura esculpir um corpo de princípios, cuja estranheza eu ainda não consegui bem identificar.
Parece-me essa estranheza, umas vezes, advir da paralaxe em que se coloca um apetite pensante avesso às facilidades do óbvio e, outras vezes, parece-me o efeito de uma postura ficticiamente predadora que, fascinada pela sua própria exuberância, encontra no território da entorse lúdica a sua única saída.
O humor que, no dr. Quadros Fernandes, é uma marca sempre em transe de revelação, cresce primeiro nessa espécie de desmesura com que ele, pisando sobre a infimidade avulsa das circunstâncias, logo ressalta para torneios de quase quixotesca especulação. Como se qualquer motivo mínimo contivesse sempre a concitação máxima da urgência de um serviço - o serviço de sentinela ao poder da fala, sempre à espreita da sua oportunidade.
Mas o humor, no dr. Quadros Fernandes, encontra a sua mais apurada variante no modo como, a partir de uma aguda percepção das conexões que constituem como grupo uma massa de interlocutores, consegue, recorrendo à desfiguração caricatural, recolocá-las num plano onde a sua liberdade de jogo e os jogos da sua liberdade ganham a sua maior ênfase. O desfrute é o seu tributo magnânimo à amizade.
Só que, em todos os casos, ele não pode dissimular a sua instante obsessão: a seriedade de uma perscruta sobre o essencial do que, mantendo-se ainda como humano, vai perdendo a sua altura na rotina congelada da experiência.
Por isso, a sua perspectiva é a do voo da águia: a visão da minúcia do alto da compreensão sempre mais larga da paisagem. E é essa visão aberta ao imprevisto, captado no pico do seu voo, que permite à sua seriedade a transbordância do humor. Felizmente, ele prefere voar em formação.»
(Um último recado, dr. Quadros Fernandes!)
Sempre lhe ouvi declarar: «Entre mim e Deus há uma relação de mútuo respeito e recíproca admiração!» Se agora vier a descobrir que lhe pedem explicações sobre tão elevada pretensão - conte com o meu testemunho abonatório.”
à Família enlutada e em nome dos BCA apresento os meus sentidos pêsames
Amândio Caldeira
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