segunda-feira, 1 de janeiro de 2007

Luanda - Mais uma mini-história…

Decorria o ano de 1968, como já escrevi antes, e instalava-se o Serviço de Informática, no BCA. Também já disse que um nosso companheiro de profissão, o sr. Manuel Soares, do BPA, Lisboa, nos acompanhou nesta fase de arranque. Como não tinha familiares em Luanda, nós, os já residentes, fazíamos-lhe o máximo de companhia possível. O trabalho, como já foi dito, nesta fase, deixava-nos poucos “tempos livres”. Ainda assim, tentávamos rentabilizá-los em convívios e distracções.

Aconteceu que nesse ano, se deslocou a Luanda, uma “Companhia Tauromáquica”, vinda de Portugal, a fim de se exibir perante os “aficionados” nesta cidade angolana.

Ora o nosso amigo Soares incluía-se nesse grupo. Lisboeta de gema (morador em Alfama) era muito ligado também às terras ribatejanas. Nunca faltava às festas taurinas de Vila Franca de Xira, da Moita e de Alcochete.

Então, o Miguel e eu, num domingo, lá o acompanhámos à tourada, na praça de Touros de Luanda, para mim a primeira a que assisti ao vivo.

Havia grande entusiasmo, não era todos os dias que Luanda nos proporcionava um tal acontecimento.

Após as cortesias da praxe, inicialmente, com a apresentação dos participantes, bandarilheiros, peões de brega, toureiros, cavaleiros e forcados, director da corrida, não esquecendo também o “inteligente”, tudo gente vinda da dita “Metrópole”, só não me lembro, se havia também “orquestra” local, a tocar o trecho da ópera Carmen, que costuma animar os grandes momentos das touradas; começou então, a tourada propriamente dita.

Soa na praça o clarim da refrega. A partir desse momento, não importa se o lugar que ocupamos é sol ou sombra, camarotes ou barreiras. Entra o toiro, também ele vindo desse cantinho da Europa. O espectáculo teria que ser “completo”, e tinha todos os ingredientes para cativar e convencer os aficionados destas terras angolanas.

Depois da expectativa habitual, em que o público avalia a bravura do touro, através do seu comportamento à entrada da arena, antes dos “curtos” ou “compridos” das “chiquelinas” ou “verónicas”, deu-se então a surpresa das surpresas, o toiro, sem que ninguém lhe tocasse, começou a sangrar abundantemente, pelo lombo abaixo!

Ouvem-se assobiadelas e um grande alvoroço, e eu sem perceber o que se passava. Entretanto, a tourada continuava…

Soubemos depois que a empresa organizadora, nesta vinda a Angola, investira pouco na quantidade de toiros; os animais tinham já sido lidados no dia anterior, neste mesmo local, e sido bastante maltratados pelos bandarilheiros.

Para mascarar a situação cobriram as feridas com gesso que depois foi pintado com tinta preta… Só que o disfarce não resultou! O gesso estalou e estalou também a bronca…

Para mim, que nem aprecio corridas de touros, foi-me indiferente, mas o nosso amigo Manuel Soares ficou furioso, e com razão, pois sentiu-se traído no seu brio de verdadeiro aficionado. Infelizmente, este amigo, já não está entre nós. Paz à sua alma.

Assim, aconteceu em Angola em 1968.

BOM ANO !

BL

1 comentário:

  1. Borges Lopes,
    Este texto para além de "divertido" é por um lado um bom exemplo da vida e do progresso de Angola onde tinham grande popularidade acontecimentos como as touradas, as corridas de automóveis, os desportos náuticos com vários exemplos de campeões, o futebol que já então batia o pé às maiores equipas da "Metrópole", o Hóquei em Patins com verdadeiros géneos a ombrear com os melhores hoquistas mundiais (nomeadamente os do nosso BCA), etc., etc..
    Por outro lado não deixa de ilustrar uma certa forma de como alguns "senhores" idos de fora tratavam os Angolanos (naturais e residentes) julgando-nos espectadores de 2ª categoria.
    E como estavam enganados, meu Deus!
    Um abraço e parabéns por esta mini-história.

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