quinta-feira, 14 de dezembro de 2006

COISAS DE ANGOLA (3)

Olá meus amigos



Com a devida autorização do RUI LAUREANO SILVA, empregado da Blackwood Dodge, coloco aqui este "post", que toca o BCA e seus ex-colaboradores.
Esta carta foi colocada pelo Rui, no fio da Sanzalangola, BANCO COMERCIAL DE ANGOLA- EX-EMPREGADOS.
Este colega vive em Montreal.



"Olá Amigos.

Não trabalhei no BCA. Apenas passo por aqui para contar uma uma quase anedota que se passou comigo nesse banco e que mostra a seriedade e confiança das gentes naquele tempo.

Estávamos nos anos 59. Tinha acabado (?) os estudos e estava à espera de ir para a tropa. Para não andar a vadiar o meu pai, por intermédio do chefe da contabilidade, seu amigo de longa data, empregou-me na BLACKWOOD DODGE.
Meu primeiro serviço foi aprender a lidar com papeladas de bancos.

Um dia, o Esteves, chefe da contabilidade chamou-me e entregou-me um envelope com 400 contos (disse ele) para eu ir depositar ao BCA. Para mim não era a primeira vez que ia depositar, quer no BCA, quer no Banco de Angola. Enfim, pego a motorizada da casa e lá vou eu.

Chamam o meu número, dou a placa, o talão de depósito e o dinheiro que o funcionário começa logo a contar, com uma destreza que sempre me impressionou.
Chegado ao fim da contagem o caixa diz-me que faltam 20$00. Fiquei um pouco desconcertado, pois era a primeira vez que acontecia. Como era pouco experiente, fiquei a olhar para o caixa que me perguntou o que queria fazer, levar de volta o dinheiro todo, ou pôr 20$ do meu bolso. Procurei nos bolsos mas não chegava. Assim disse ao caixa:

- Olhe eu trabalho para a Blackwood. Nao é longe. Guarde-me aqui o dinheiro que vou buscar os 20$ e volto já.

Isto no sentido de evitar ir novamente para a bicha. Entretanto era quase meio dia.

Cheguei ao escritório e disse:
- Sr. Esteves, faltavam 20$.
- Bom, devo-me ter enganado a contar. Nao faz mal vai-se lá a tarde. Dê-me o dinheiro.
- Eu deixei lá o dinheiro com o caixa.
- E onde está o recibo?
- Não tenho, ele guarda-me o dinheiro até eu levar os 20$.
- O quê?... então você deixa 400 contos com alguém que não conhece? E agora quando lá for se ele disser que não foi com ele ou que não se lembra de si, o que é que você vai fazer. Já viu no buraco em que nos meteu a todos. Sabe quanto são 400 contos? etc, etc. Grande sermão e eu sem poder dizer nada em minha defesa.
- Vá lá depressa buscar o dinheiro, se ele ainda lá estiver. Mas vá a rezar para que não haja problemas.

Só então realizei a o incidente. Eu não conhecia o caixa de lado nenhum, nem me lembrava de o ter visto antes no banco. Lá fui eu na braza, rezando pelo caminho.

Quando lá cheguei vi o caixa, passei pela fila da caixa e com o coração a sair-me pela boca mas tentando mostrar-me calmo, disse para o caixa.

- Olha sabe, eu venho cá à tarde. Dê-me o dinheiro porque vamos fazer um depósito maior.

E o caixa, com a maior das naturalidades, baixou-se e entregou-me aquela pequena fortuna, como se se tratasse de uma carta ou outro qualquer papel...Calmamente saí do banco e só cá fora tive coragem para abrir o envelope comercial e, quando vi lá o dinheiro apeteceu-me dar um berro de contentamento.

Nunca mais esqueci este incidente. Chegado ao escritório, ainda não tinha aberto a boca que o chefe me perguntava:

-TAVA LÁ O DINHEIRO ???

E eu tentando parecer natural:
- Claro que estava. Eu conheço o homem...

- ISSO NÃO SE FAZ NEM COM CONHECIDOS ...

- Naquele tempo havia ainda gente séria. Hoje ainda deve haver também, não sei. Mas eu continuo a confiar nas pessoas..."

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

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  2. Excelente texto deste "amigo" e certamente muito apreciado ex-cliente (ao serviço da empresa) do BCA.
    Obrigado Rui Laureano em meu nome, e creio que posso dizê-lo, de todos nós.

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